26 fevereiro 2007

“(...) Parece que a espera faz o vazio em nós, que prepara a retomada do ser, que ajuda a compreender o destino; numa palavra, a espera fabrica localizações temporais para receber as recordações. Quando o acontecimento claramente esperado sobrevém - novo paradoxo-, ele nos aparece como uma clara novidade. Nada se passa como havia sido previsto; o acontecimento vem assim ao mesmo tempo satisfazer e frustrar nossa espera, justificar a continuidade da localização racional vazia e impor a descontinuidade das recordações empíricas. Todos os que sabem desfrutar de uma espera, mesmo ansiosa, reconhecerão com que arte ela urde o pitoresco, o poético, o dramático. Ela faz o imprevisto com o previsto. (...) A espera, ao escavar o tempo, torna o amor mais profundo. Ela coloca o amor mais constante na dialética dos instantes e dos intervalos. Dá a um amor fiel o charme da novidade. Então os acontecimentos ansiosamente esperados se fixam na memória; adquirem um sentido em nossa vida. As grandes recordações são assim o desfecho do drama de um dia, de uma hora. São a recompensa de uma recusa prévia a viver outra coisa além do que aquilo que se deseja. É adiando as ações medíocres, obstinando-nos em prever o imprevisível, que nos preparamos para ser ricamente contraditados pela felicidade. Contradizendo-nos, o acontecimento se fixa em nosso ser. A assimilação dialética é a própria base da fixação de nossas recordações. Não há memória acidental sem um drama inicial, sem uma surpresa dos contrários”.

Gaston Bachelard, em “A dialética da duração”, pág. 49.

Um comentário:

Anônimo disse...

"São a recompensa de uma recusa prévia a viver outra coisa além do que aquilo q se deseja" essa é a melhor parte de tds... E nao é isso q eu fiz minha vida inteira?
Realmente, esse é daqueles textos q a gente gosta...
E, por isso, eu te digo: Chega de espera!! Ta na hora de, nos duas, nos jogarmos na vida!
(comentario gde e auto-referente, hein?)
Bjo